Total de visualizações de página

quarta-feira, 9 de outubro de 2013

Desabafar é bom

 
 
Ah, como é bom ter para quem contar as coisas. Outro dia cheguei em casa com fumacinhas saindo da cabeça, tamanha minha irritação com questões variadas no trabalho, que vim remoendo no caminho. Se meu marido não estivesse em casa, eu teria continuado insistindo mentalmente no assunto por um bom tempo, e só me irritando mais.

Mas não: ele estava aqui, e me ofereceu seus ouvidos e comiseração. Era tudo de que eu precisava: uma oportunidade para meu cérebro finalmente executar o longo programa motor que ele vinha montando havia horas, desfiando e revisando minhas misérias do dia, e botar tudo para fora, em palavras, para então poder sossegar.

Por isso segurar um segredo dá tanto trabalho – e por isso contar é tão bom. Preocupações, assim como segredos, são representações mentais angustiantes, aflitivas, que levam à ativação de uma estrutura do cérebro especializada em antecipar problemas, o córtex cingulado anterior. Ativado, ele, por sua vez, dispara uma série de alarmes, parte da resposta ao estresse da preocupação, que deixam tanto corpo como cérebro tensos. Além disso, já que o cérebro sabe colocar seus pensamentos em palavras, ficamos remoendo a preocupação ou o segredo, ensaiando mentalmente sua versão motora, produzida pela boca. Mas, sem ter com quem desabafar, ou para quem contar, esse programa motor fica só na vontade, e não sai. E assim tem-se um cérebro cada vez mais aflito, que tem de fazer força cognitiva, atenta, para segurar ativamente suas palavras.

Por isso colocar tudo para fora é tão bom: assim o programa motor tão ensaiado é executado e não precisa mais ser segurado pelo seu córtex pré-frontal; assim o cingulado anterior pode soltar um “Ufa!” e desligar os alarmes que ajudavam o resto do cérebro a manter o controle.

Essa é uma das razões pelas quais a psicoterapia pode ser tão boa: o simples desabafo. Claro, amigos, parentes, padres, e às vezes até a pobre da pessoa sentada ao seu lado esperando o ônibus também servem quando tudo o que se precisa é uma oportunidade para despejar as preocupações em palavras.

Falar da gente mesmo é muito bom. Um estudo recente da Universidade Harvard mostrou que, tendo opção entre responder perguntas sobre os gostos e hábitos dos outros, sobre simples fatos, ou sobre si mesmos, os participantes preferiam falar do próprio umbigo – e até pagavam para escolher esta alternativa, e de dentro de um aparelho de ressonância magnética, onde só os pesquisadores viam suas respostas. A preferência por falar de si mesmo está relacionada a uma maior ativação das estruturas do sistema de recompensa, o que gera prazer.

Funciona mesmo quando segredo completo é garantido. Mas, seres sociais que somos, a ativação do sistema de recompensa é especialmente alta quando os voluntários sabem que suas respostas serão ouvidas pelo acompanhante que eles levaram para o estudo. Falar de si é bom, mas falar de si para os outros é melhor ainda.

Não é à toa, portanto, que a liberdade de expressão pessoal e de opinião é altamente valorizada. Não se trata apenas de um construto social ou cultural: o prazer de expressar seus próprios pensamentos e estado de espírito é real, mensurável, e vem lá dos cafundós do cérebro. E quando os próprios pensamentos são aflitivos, o desabafo ainda é um alívio só.

Uma ressalva, contudo: pelas mesmas razões, ficar revisitando e remoendo um mesmo problema meses a fio, ao longo de sessões e mais sessões de terapia, muitas vezes é um tiro no pé. É preciso saber deixar o problema ir embora. (05/02/2013).
 
Fonte: Revista Mente e Cérebro

segunda-feira, 7 de outubro de 2013

Os primeiros sinais físicos da depressão

 
Dor de barriga, nas têmporas, nas costas... Esses podem ser os primeiríssimos sinais de que alguém está prestes a mergulhar de cabeça em um quadro depressivo, alertam os médicos
 
Depressão
Muitas vezes as dores ficam sem alívio até a cabeça ser tratada

Há boas chances de um sintoma físico aparecer muito antes de a tristeza profunda ficar estampada na cara da vítima de depressão e ela não conseguir mais esconder sua perda de interesse pelo mundo exterior. Hoje os cientistas sabem: o quadro depressivo tende a emergir na forma dos mais diversos tipos de dor no corpo. E não confunda isso com um processo de somatização, em que distúrbios emocionais produzem mal-estar orgânico. 
 
"Os circuitos que a depressão ativa são íntimos de regiões do sistema nervoso, inclusive o autônomo, que comanda o funcionamento dos órgãos", explica Renato Sabbatini, neurofisiologista da Universidade Estadual de Campinas, a Unicamp, que fica no interior paulista. Ricardo Alberto Moreno, do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas de São Paulo, emenda: "Cerca de 60% dos casos da doença são associados a males orgânicos, a maioria deles acompanhada de dor". 
 

Como isso acontece

Os cientistas apontam o causador: o mau funcionamento da serotonina, da noradrenalina e da dopamina. O trio de neurotransmissores, fundamental na regulação do humor, circularia com menos eficiência entre os neurônios de um deprimido e isso dificultaria a transmissão de milhares de mensagens químicas. E aí, em um efeito dominó, outras falhas de comunicação apareceriam. "A ausência dessas substâncias prejudica diversas áreas, inclusive as responsáveis por inibir dores", explica Telma Gonçalves de Andrade, especialista em psicofisiologia da Universidade Estadual Paulista, a Unesp, em Assis, também no interior de São Paulo. 
 
O sistema imunológico é outro afetado. "Os deprimidos correm um risco três ou quatro vezes maior de adoecer", conta Sabbatini. Também pode acontecer de uma série de doenças aproveitar a brecha criada pelos neurotransmissores. Ou seja, quem de repente passa a ficar doente com muita frequência não deve se conformar com a velha explicação: de que isso é estresse. É preciso refletir se não existe algo mais profundo (e tristonho) por trás.
 
O sono é mais um que acusa prejuízos quando o cérebro está deprimido. Sabe-se que a ausência de serotonina atrapalha o adormecer, mas esse não é o único ponto. O desbalanceamento químico por trás do transtorno emocional afeta todo o ciclo circadiano, ou seja, o relógio que regula o funcionamento do organismo ao longo das 24 horas. Assim, a pessoa perde a sincronia com o meio ambiente, afetando a quantidade e, principalmente, a qualidade das horas dormidas. 
 

Não confunda melancolia com depressão

Os médicos querem divulgar cada vez mais aos leigos e aos próprios colegas que nem sempre melancolia é depressão. "Tristezas fazem parte da vida", lembra Sabbatini. Ao mesmo tempo, nem sempre a depressão se enquadra no retrato da pessoa arrasada, trancafiada no quarto, muda... Ela pode estar por trás dos tais sintomas físicos - em casos raros, a angústia nem chega a brotar, só as dores do corpo é que afloram e ficam sem alívio até a cabeça ser tratada. Com antidepressivos ou tratamento clínico. 
 

Tratamento

Além de remédios, os especialistas apostam na psicoterapia - seja a cognitiva comportamental, que estimula o deprimido a deixar de lado pensamentos destrutivos, seja a interpessoal, que identifica situações de conflito para aprimorar a capacidade de o paciente interagir e aliviar o abatimento. "Estudos de neuroimagem comprovam que a eficácia desses tratamentos é similar à dos remédios", revela Helena Maria Calil, professora titular de psicofarmacologia da Universidade Federal de São Paulo e presidente da Abrata. Quando a depressão é tratada corretamente, diga-se, o ânimo volta e as dores, onde estiverem, esvaecem.
 
Fonte: mdemulher.abril.com.br  

domingo, 6 de outubro de 2013

Você não é a sua mente

  

Identificar-se com a mente, faz com que estejamos sempre pensando em alguma coisa. Ser incapaz de parar de pensar é uma aflição terrível, mas ninguém percebe porque quase todos nós sofremos disso e, então, consideramos uma coisa normal. O ruído mental incessante nos impede de encontrar a área de serenidade interior, que é inseparável do Ser. Isso faz com que a mente crie um falso eu interior que projeta uma sombra de medo e sofrimento sobre nós.

Examinaremos esses pontos detalhadamente, mais adiante.
O filósofo Descartes acreditava ter alcançado a verdade mais fundamental quando proferiu sua conhecida máxima: “Penso, logo existo.” Cometeu, no entanto, um erro básico ao equiparar o pensar ao Ser e a identidade ao pensamento.
 
O pensador compulsivo, ou seja, quase todas as pessoas, vive em um estado de aparente isolamento, em um mundo povoado de conflitos e problemas. Um mundo que reflete a fragmentação da mente em uma escala cada vez maior. A iluminação é um estado de plenitude, de estar “em unidade” e, portanto, em paz. Em unidade tanto com o universo quanto com o eu interior mais profundo, ou seja, o Ser. A iluminação é o fim não só do sofrimento dos conflitos internos e externos permanentes, mas também da aterrorizante escravidão do pensamento. Que maravilhosa libertação!
 
Se nos identificamos com a mente, criamos uma tela opaca de conceitos, rótulos, imagens, palavras, julgamentos e definições que bloqueia todas as relações verdadeiras. Essa tela se situa entre você e o seu eu interior, entre você e o próximo, entre você e a natureza, entre você e Deus. É essa tela de pensamentos que cria uma ilusão de separação, uma ilusão que existe você e um “outro” totalmente à parte. Esquecemos o fato essencial de que, debaixo do nível das aparências físicas, formamos uma unidade com tudo aquilo que é. Por “esquecermos” quero dizer que não sentimos mais essa unidade como uma realidade evidente por si só. Podemos até acreditar que isso seja uma verdade, mas não mais a reconhecemos como verdade. Acreditar pode até trazer conforto. No entanto, a libertação só pode vir através da vivência pessoal.
 
Pensar se tornou uma doença. A doença acontece quando as coisas desequilibram. Por exemplo, não há nada de errado com a divisão e a multiplicação das células no corpo humano. Mas, quando esse processo acontece sem levar em conta o organismo como um todo, as células se proliferam e temos a doença.
 
Se for usada corretamente, a mente é um instrumento magnífico. Entretanto, quando a usamos de forma errada, ele se torna destrutiva. Para ser ainda mais preciso, não é você que usa a sua mente de forma errada. Em geral, você simplesmente não usa a mente. É ela que usa você. Essa é a doença. Você acredita que é a sua mente. Eis aí o delírio. O instrumento se apossou de você.
 
Estamos tão identificados com ela que nem percebemos que somos seus escravos. É quase como se algo nos dominasse sem termos consciência disso e passássemos a viver como se fôssemos a entidade dominadora. A liberdade começa quando percebemos que não somos a entidade dominadora, o pensador. Saber disso nos permite observar a identidade. No momento em que começamos a observar o pensador, ativamos um nível mais alto de consciência. Começamos a perceber, então, que existe uma vasta área de inteligência além do pensamento, e que este é apenas um aspecto diminuto da inteligência. Percebemos também que todas as coisas realmente importantes como a beleza, o amor, a criatividade, a alegria e a paz interior surgem de um ponto além da mente. É quando começamos a acordar.
 
Eckhart Tolle